Na década de quarenta, mil e novecentos, das terras do Lubango, havia comerciantes que saiam da cidade, levando a lugares distantes, mostras dos seus produtos, para expandir negócio, fornecendo assim muitas povoações. E faziam-no com empenho e perseverança, por caminhos difíceis...
Associando-se, iam geralmente dois companheiros, para viagens longas. Juntos escolhiam trajectos, planeavam tudo com antecedência, e carregavam na véspera, a carrinha Fargo.
Saiam na madrugada ainda fresca, pelo cedo da hora, rumo a Vila da Ponte, (Artur de Paiva) em estrada que era de terra batida, naquele tempo, acidentada e muito poeirenta até as chuvas chegarem...
Procurava peles e cera, o Pereira, para a sua indústria de curtumes que crescia então, lá para os lados da Mucanca, em terras do Planalto. No mostruário levava sapatos e botas, de fabrico próprio, e anotava as encomendas dos mesmos, que mandaria entregar mais tarde, em carro pesado.
Ia com Martinho, companhia em muitas dessas jornadas, dono de Ourivesaria na cidade, que com ele levava coisas valiosas para mostrar também; era investimento ou luxo de quem podia.
Voltar ao carro logo logo, era imperioso para respeitar horário que não deixava preguiçar muito, pois tinham tempo calculado, com a prevenção para algum imprevisto... e tantos surgiam, por aquelas paragens...
Dois eram os ajudantes que levavam, Paulino e Sabonete, rapazes novos, pois naquele trajecto de mais braços e fortes se precisava, porque o carro enterrava, ou afundava na lama do leito do rio. Os pneus, que furavam muito, em terreno mole deixavam de andar; com capim e ramos se dava consistência ao piso, debaixo das rodas. O esforço era grande, o desgaste também!
Enquanto progrediam, devagar, quando sem sobressaltos, em picada de trilho fundo, uma cantilena soava, compassada, para ajudar a chegar ao destino. Quipungo (Vila Paiva Couceiro), estava quase ali, mas como terra vizinha e familiar, carenciava de mais demora, até por que lá se podia fazer a compra de peles: de bovino, caprino e antílopes. E cera havia bastante também!
Capelongo (Vila Folgares) era passagem, contactos aí, havia-os, já de rotina, mas sempre algo de novo era motivo de conversa e tratavam-se assuntos de negócio...
Vila da Ponte, surgia só depois de longo e agitado percurso, com calor de tarde Africana, muito mosquito do rio Cunene. Cansava e desesperavam-se, por vezes, passando chanas imensas, atravessando afluentes do rio Cubango, com margens difíceis de alcançar. Mas mais além, Vila Serpa Pinto era do roteiro, o ponto mais a Sul do percurso determinado, e ei-los chegados...
A noite, passava-se em pensão de proprietário amigo, que tinha a família toda a trabalhar ali. Recebiam com euforia quem chegava, e ouviam com avidez, notícias de parentes e amigos espalhados, deixados para trás, ao longo da viagem.
Fizera-se o trabalho que além os levara, melhor, pior negócio, era a procura devida e possível na época... E continuava, no regresso, subindo a Caconda, sede de concelho, onde o desenvolvimento prometia. Na descida, zona já mais povoada, bem conhecidos das gentes do Lubango, eram os Postos administrativos de Caluquembe e Negola. Chegar a Quilengues sabia a final de missão e, quase na cidade, ainda no Hoque, a temperatura agradável permitia um curto período de descanso.
Uma TRAVESSIA que acabava com a chegada a casa, e foi a história contada ao final do dia, recordando como aventura, um princípio de vida, que foi o seu... com saudade!Publicado por Zory
http://canais.sol.pt/blogs/zory/default.aspx?p=2
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