quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Os Retornados do ex-Ultramar na valorização da sociedade portuguesa

Um artigo que encontrei na net

ANTÓNIO PIRES

Uma das ideias feitas que ainda hoje subsiste no nosso País, é a de que os «retornados do Ultramar» constituíam uma legião de indivíduos que vieram agravar de várias formas o já de si deplorável estado da sociedade portuguesa à data da Descolonização.

Sociedade que estava sofrendo o inevitável depauperamento causado pela emigração maciça dos seus braços mais válidos em busca de melhores condições de vida, sangria que começara muito antes das chamadas «guerra colonial» e que esta veio inevitavelmente acentuar.

Disse-se, escreveu-se, e ficou gravado no entendimento comum dos portugueses, que a maioria dos retornados era uma legião de pessoas rudes, na maioria já de idades avançadas, que tinham queimado as suas energias pelas terras de África, pouco produtivas para a tarefa da reconstrução nacional, e sobretudo escassamente preparados do ponto de vista profissional.

A ideia geral que se fazia — e intencionalmente se propalou!... acerca dos retornados do ex-Ultramar, era a de uma maioria de rudes capatazes agrícolas, broncos e violentos, de astutos comerciantes do mato, e de uns tantos «endinheirados» que exploravam negócios altamente chorudos!

Acontece que os sucessivos contingentes que os aviões despejavam diariamente no Aeroporto de Lisboa, nos dois ou três meses que se seguiram ao êxodo maciço dos portugueses de Angola e de Moçambique, bem como as imagens fotográficas ou da Televisão, davam uma aparência de realidade a tão deploráveis e errados juízos.

São hoje suficientemente conhecidas as deploráveis condições em que os retornados de Angola e Moçambique regressaram a Portugal - nove em cada dez, apenas com as roupas que tinham vestidas no momento do embarque, por não terem tido tempo nem possibilidade de voltar aos lares de onde tinham sido expulsos a ferro e fogo para salvar as vidas.

Todavia, serenada a tempestade ou calamidade que se abateu sobre os retornados do Ultramar, acalmadas as inevitáveis paixões políticas e serenados os juízos precipitados — as estatísticas encarregaram-se de rectificar as asneiras insidiosas e intencionais, e de dar ao País um retrato real dos retornados, sob mais diversos aspectos.

Paralelamente, as manipulações da opinião pública foram cessando, e estudiosos atentos e imparciais debruçaram-se sobre a realidade - e os retornados do ex-Ultramar surgem aos olhos da opinião pública e dos seus concidadãos em geral, como aquilo que na realidade são.

Para esboçar esse retrato do retornado socorremo-nos de um valioso e insuspeito estudo realizado por um grupo de universitários, prefaciado por uma brilhante Secretária de Estado de um dos Governos pós 25 de Abril, editado pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento, para neste momento e neste local, traçarmos um RETRATO DE CORPO INTEIRO dos retornados, e da sua contribuição para a revitalização da sociedade portuguesa.

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O apuramento realizado pelo Instituto Nacional de Estatística em 1978, citado pelo referido grupo de universitários no estudo que consultámos, referia a existência de 505.078 indivíduos entrados no País e inscritos como «retornados do Ultramar». Em termos percentuais esses 505 mil retornados representavam pouco mais de 5% do total da população nacional.

Este número é discutível e muitas fontes insistem em números mais elevados, entre 700 a 800 mil. Mas trata-se de números oficiais, registados pela estatística oficial, e é em presença deles que temos de raciocinar.
Ora, segundo os números do Instituto Nacional de Estatística, daqueles 505.078 retornados, um pouco mais de metade - exactamente 298.968 - eram nascidos ou oriundos de Portugal, e portanto os restantes 206.110 eram portugueses já nascidos nas então províncias ultramarinas.

Por enquanto trata-se apenas de distinguir entre portugueses oriundos de Portugal que regressavam ao país de origem, e portugueses nascidos noutras terras e aos quais, só por isso, parecia querer negar-se a qualidade de portugueses também...

Porém, o que é realmente importante, e mostra insofismavelmente que os retornados vieram rejuvenescer a sociedade portuguesa, é a observação desses dados estatísticos quando entra na discriminação etária, cultural e profissional dos retornados. Assim, sob tais aspectos, verifica-se que: daqueles 505.078 retornados, 65,5% tinham menos de 40 anos e constituíam portanto uma parcela válida. Mas acima dos 40 e até aos 64 anos a percentagem de retornados era de 29,8% - todos sabem como no Ultramar os homens até aos 60 anos eram uma das parcelas mais válidas das populações, senão em energias físicas pelo menos em saber e experiência acumulada.

Além disso, do total de retornados, 52,74% eram homens e apenas 47,26% mulheres — o que pressupõe uma maioria de braços válidos para o trabalho.

Porém, um dos aspectos mais importantes desta notação estatística, é aquele que refere que a população retornada era em regra profissional e intelectualmente mais bem preparada do que a da metrópole, pois que do recenseamento efectuado, resultava que: 48,4% tinha instrução primária (numa época em que na metrópole havia mais de 20% de analfabetos); e dos restantes 51,6%, descontando apenas 6,5% de não-alfabetizados constituídos quase exclusivamente por crianças com menos de 10 anos de idade, havia 8,5% de possuidores de cursos superiores incluindo médicos, professores universitários, investigadores, advogados, etc., e mais de 30% possuíam cursos médios, secundários e profissionais.

Com a entrada dos retornados, a sociedade portuguesa foi subitamente enriquecida com mais de 5.000 mil engenheiros, arquitectos e técnicos dos mais elevados graus e ramos da engenharia civil e de minas, de industrias transformadoras e outras; cerca de 1.800 biólogos, agrónomos, investigadores dos ramos fisico-químicos e similares; quase 13.000 professores e outros docentes de todos os ramos do ensino, desde o primário ao universitário; 325 navegadores, pilotos e outro pessoal especializado da navegação aérea e marítima; cerca de 16.000 quadros de serviços administrativos e outros, desde estenógrafas a operadores de informática.

No sector da produção, a força do trabalho metropolitana foi enriquecida com mais 13.000 mecânicos especializados; cerca de 7.000 serralheiros civis, montadores de estruturas metálicas, caldeireiros e profissões similares.

A construção civil, cuja maior força de trabalho tinha emigrado para os países da Europa, foi enriquecida com 13.000 pedreiros, carpinteiros e outros profissionais dos mais diversos ramos.

As indústrias transformadoras foram enriquecidas com mais 12.000 operários especializados, desde os ramos têxtil ao da alimentação e bebidas, da mecânica fina ao mobiliário.

O sector dos transportes viu-se repentinamente valorizado com a entrada de mais 13.000 condutores de veículos pesados e de transportes públicos.
No sector agro-pecuário surgiram mais 16.000 capatazes e condutores de trabalhos agrícolas, de maneio e tratamento de gados ou de exploração florestal, em escalas que, em muitos casos, não eram conhecidas neste país.

Mas vieram ainda cerca de dez mil trabalhadores dos ramos de hotelaria, restaurantes e similares, cozinheiros, ecónomos e outros.

Porém, e talvez mais importante ainda que as suas especializações profissionais, os retornados trouxeram à força de trabalho do País a contribuição valiosíssima da disciplina, da produtividade, da assiduidade, que rapidamente os distinguiram (e não raro os tornaram detestados...) num ambiente em que apenas se falava de postos de trabalho... mas não se trabalhava; em que o absentismo ascendeu a taxas inconcebíveis, em que os locais de trabalho se transformaram em centros de organização de manifestações a propósito de tudo e de nada.

Cremos que estes números, extraídos de fontes absolutamente insuspeitas, serão suficientes para desfazer certas ideias que, infelizmente, ainda de tempos a tempos afloram em certos meios e em determinadas ocasiões, acerca dos Retornados do ex-Ultramar.

Na realidade, e a despeito das desgraçadas condições em que se desenrolou o seu regresso à Pátria de origem ou de opção - o fluxo dos retornados constituiu na realidade um indiscutível e precioso factor de valorização da sociedade portuguesa, em praticamente todos os sectores da vida nacional.

Quando dos meus textos sobre a diferença de mentalidades e diferença de instrução entre Luso-Angolanos e Metropolitanos fui desmentido e contestado. Estaria enganado?
Ruca

Descolonização de Angola: a Odisseia dos espoliados

O DIA DA PARTIDA

24 de Setembro de 1974. Consegui mandar para o Lobito o meu carro e alguns caixotes com os nossos parcos haveres de valor sentimental e os meus livros, reunidos na nossa vida de trabalho, para serem embarcados para Portugal. Encarregou-se do transporte um camionista mestiço de Nova Lisboa que não quis ir para Portugal porque não tinha lá ninguém.

O ponto de reunião de alguns gabelenses e meus irmãos que estavam na FIL, era a minha casa, para tomarem banho de água quente. Os meus pais estavam comigo, bem como a minha irmã, a cassula da família.

Três dias antes fora levá-los ao aeroporto para apanharem a ponte aérea. Fiquei com uma carrinha Peugeout de um gabelense que também frequentava a minha casa e levei-os também para o aeroporto.

Era cada vez mais difícil passar pelas barreiras da UNITA que, famintos, mandavam parar toda a gente para "roubar" qualquer coisa, nem que fossem só cigarros. Os meus conhecidos do FNLA que, talvez por eu ser natural do Zaire, me protegiam por solidariedade valeram-me muitas vezes contra aqueles energúmenos da UNITA que eram racistas, diga-se o que se disser. Eles é que semearam o medo nos portugueses, pelas ameaças constantes, invasão das casas e barreiras em todos os locais de Nova Lisboa. As situações, por vezes, eram altamente perigosas. O campo de execuções era no Sacaála.

E o exército português, para agravar ainda mais, é que fomentava a nossa fuga "porque não se responsabilizava com o que nos pudesse acontecer".

A "facção Chipenda" é que prestou assinalável serviço de protecção aos portugueses apesar de ter por lá alguns elementos, de última hora, brancos portugueses, que criaram alguns conflitos com outros portugueses. Eram mais papistas do que o papa. Mas também vieram cá parar

Chegou o dia de embarcarmos. Depois do almoço (Tivemos carne até ao último dia e acabamos com a garrafeira do meu irmão Néné), dirigi-me para o aeroporto com as nossas maletas na traseira da carrinha. Consegui passar sem incidentes, mas no aeroporto os populares atropelavam-se para descarregar a carrinha e quando dei por mim já não sabia das maletas. O que vale é que eles queriam apenas uma gorjeta por transportá-las até o barracão onde estavam amontoados os refugiados à espera de transporte para longe daquele pesadelo. A carrinha ficou abandonada na rua. Alguém ficou com ela.

Colchões espalhados pelo chão, muito sujo, pois ninguém se preocupava em limpar, centenas de pessoas à espera, as casas de banho, noutro edifício ao lado, cheias de dejectos, papel e água a correr pelo chão. Estava tudo entupido e os refugiados é que tinham de as desentupir se quisessem ter um pouco de higiene.

Crianças a chorar, algumas de fome, pois a espera era longa para os que foram antes de serem chamados. Tumultos à porta quando a UNITA queria impedir alguém de embarcar, principalmente negros e algumas mestiças que cobiçavam, sobre o olhar dos nossos militares (que por vezes esboçavam umas arremetidas "moles"contra os guerrilheiros) todos desalinhados, fralda de fora, barba por fazer, sem boina na cabeça.

O que valeu a muita gente foi a acção da FLNA que afastava os da UNITA.

Tratei das formalidades e por azar calhou-me um avião da TAP, os "burocratas". Só podia levar 30 quilos e a mala mais pesada que transportava os meus apontamentos, livros técnicos, manuais, relatórios e provas de âmbito profissional que me iriam ajudar em Portugal, tiveram que ficar à espera de uma vaga noutro avião.

Enquanto que nos outros aviões estrangeiros, mandavam entrar todo o mundo com a bagagem que traziam e mandavam parar a um dado momento, na TAP era tudo lentamente e com burocracia e sem um sorriso ou mostra de simpatia por parte dos profissionais daquela companhia. Vim a saber que os aviões têm um dispositivo que vai pesando a carga e quando chegava ao limite seguro o comandante mandava parar. Simples e rápido.

Sentia-me num mundo irreal. Não me saía da cabeça aquelas filas enormes, onduladas, de gente cabisbaixa, olhar receoso, silenciosa, a caminharem pastoreadas pelos controladores para o bojo do avião. Impressionou-me a visão do meu pai, um homem de 1,85 m, com 120 Kg, uma força da natureza, com os ombros caídos a olhar para trás como que a despedir-se da terra que nunca quis abandonar.

Chegou a minha vez.


A CHEGADA A PORTUGAL

25 de Setembro de 1975. Chegamos a Lisboa ao amanhecer. Procurar as malas e carregá-las para um canto. Enquanto a minha mulher e filha ficaram a tomar conta da bagagem fui tratar das formalidades. Entregas de guias, senhas para refeições no aeroporto e câmbio de dinheiro para as nossas primeiras necessidades. Só cinco mil escudos por pessoa, a um câmbio impossível de descrever.

O aeroporto cheio de gente amontoada em grupos familiares, caixas, malas, sacos, mantas, etc, muitos deitados pelo chão com o cheiro característico, abafado, de tanta gente a respirar em espaço fechado.

Ao fim de muitas voltas, sempre sem parar, só pelas 23h00 é que nos meteram numa camioneta coberta com uma lona e bancos de correr de madeira, e nos levaram para a Costa da Caparica, uma pequena pensão, de nome "Colibri", já cheia de retornados e onde não havia lugar para todos. Enquanto esperávamos entabulei uma conversação com a dona da pensão, uma arquitecta muito educada, que simpatizou connosco e por não haver lugares disponíveis dispensou-nos uma moradia particular, dela, perto dali.

A providência veio novamente a nosso favor. Era um apartamento com duas divisões e uma casa de banho só para nós.

Ao levantarmo-nos no dia seguinte de manhã, um dia lindo, sol radioso, espreito para a rua e não noto diferença nenhuma de Angola, ou seja, as ruas com areia da praia e, surpresa, pretos a varrerem a rua e a circularem. Parecia estar em Novo Redondo. Só um pouco depois é que entrei na realidade. Já estava em Portugal.

Até meados de Outubro andei praticamente sempre a caminho do aeroporto, à procura da tal mala que ficou, e por sorte chegou cá noutro avião. A pensão era agradável, boa comida, cozinheira e pessoal de serviço todos negros cabo-verdeanos e o ambiente até nem era mau, não fossem as crianças endiabradas que fizeram alguns estragos na decoração das paredes e corrimões das escadas. As paredes do salão tinham frescos de árvores com a folhagem pelo tecto e conchas decorativas, que foram arrancadas até à altura a que as crianças chegavam. Os corrimões, estilo antigo, com dourados e franjas nos forros de veludo, bem como os tapetes e alcatifas, também não resistiram.

A pensão distribuia senhas de ida e volta, por conta do IARN, de transportes públicos para irmos a Lisboa.

Tornava-se difícil procurar um modo de vida, um emprego, porque o tempo era totalmente gasto nas deslocações e nas filas de espera para tratar do assunto mais simples ou para pedir uma informação.

O pior eram as filas na Junqueira, onde estava o IARN, para tratar dos assuntos referentes à estadia. Entrávamos na fila às seis ou sete da manhã e só conseguíamos ser atendidos lá para o meio da tarde. O que valia eram os vendedores ambulantes que providenciavam umas sandes e uma bebida para aguentarmos aquela canseira.

A situação na função pública estava longe de se resolver, pois eu era assalariado e os assalariados ainda não eram considerados funcionários públicos pelo Quadro Geral de Adidos, apesar de terem aceite a inscrição de todos os assalariados em Angola. Burocracias.

Resolvemos deixar a pensão e sair daquele inferno quase diário para conseguir autorização para ir continuando na pensão, para organizarmos a nossa vida o mais depressa possível.

Portugal recebeu imensas ajudas para os "retornados" e acho que teria sido mais útil dar um subsídio substancial a cada um para iniciarem nova vida, do que manterem aquela burocracia sem controlo em que muitos encheram os bolsos e outros nada receberam. Enquanto os mais espertos enriqueceram com a desgraça de todos, e outros permaneceram indefinidamente nos hotéis e pensões pagos pelo IARN sem iniciativa para organizarem a sua vida, a grande maioria foi à luta e venceu.

Eu resolvi ir à vida.

Chegamos à Beira Alta em 18 de Outubro de 1975, sempre a cair uma chuva miudinha e a preparar-se um Inverno rigoroso. Nunca tive tanto frio na minha vida. Ficamos na casa dos meus sogros que tinham vindo mais cedo para Portugal. O meu sogro era reformado dos CFB.

Eu, com 29 anos de idade, com mulher e filha, tinha de começar tudo do ponto zero, pois tudo o que tínhamos ficou em Angola. Ainda consegui embarcar, por um intermédio de um amigo camionista que transportou os caixotes e o meu carro para o Lobito, os meus livros e alguma loiça e roupa em três malas de porão. O carro ficou por lá. Os caixotes chegaram bem. Fui despachá-los na gare ferroviária de Alcântara para a Beira Alta. Por precaução envolvi as malas de porão com cintas metálicas. Mas isso despertou a cobiça dos portugueses que detestavam os retornados. As malas chegaram ao destino todas rebentadas, sem as cintas e as tampas fora dos gonzos e os pratos e copos todos partidos. Quer dizer: as malas aguentaram perfeitamente o embarque no Lobito e viagem de barco e descarga em Lisboa, em péssimas condições, como devem saber. Ali, no porto de Lisboa, largavam os caixotes dos retornados muito antes de chegarem ao solo para se estilhaçarem com o embate no solo. Pois, os meus chegaram bem. Assisti à carga das malas na carruagem do comboio e se chegaram todas rebentadas à Guarda é porque alguém as arrombou pelo caminho e como não havia nada de valor partiram tudo.

Ia periodicamente a Lisboa, ao IARN, mandavam-me para o QGA e ia ao QGA que me mandavam para o IARN. Valeu-me uma assistente social (do IARN) que compreendeu a situação e me foi assegurando o subsídio que davam aos retornados trimestralmente, porque se desse de frente com outro qualquer funcionário do IARN já não tinha a mesma sorte. Mandavam-me para o Adidos. Era o Portugal daquele tempo. Mantinha também os contactos com os colegas e técnicos superiores da Chianga que já estavam colocados, na maioria, na Estação Agronómica de Oeiras e procuravam montar mais algumas estruturas de apoio, contando com os profissionais desocupados. Portanto a minha situação mantinha-se suspensa.

Enquanto esperava que o governo decidisse que os funcionários assalariados ingressassem no QGA (e acabassem com aquela situação equívoca em que andávamos dos IARN para o QGA e vice-versa, sem ninguém querer responsabilizar-se pela distribuição da ajuda a que tínhamos direito, como todos os retornados e muitos não retornados que passaram por retornados para receberem essa ajuda) completei um ensaio filosófico que escrevi em Nova Lisboa, cuja edição achei demasiado incompleta, e acabei o Curso de Psicologia. Fui a Lisboa fazer o exame final e o seminário (aulas práticas em dois dias) para receber o respectivo Diploma e, consequentemente, poder optar por outra via profissional se necessário. Ainda fui Delegado do Centro Médico de Psicologia e Orientação Profissional de Lisboa, mas naquele tempo a Psicologia não rendia o suficiente, nem o país estava habituado a recorrer a exames psicotécnicos e de orientação profissional.

Fiz alguns exames de Orientação Profissional a particulares, para praticar (género estágio assistido) sempre com o apoio e interpretação final do Centro Médico, até ser lançado por conta própria, mas essa actividade não era nada rentável neste país tão atrasado na altura. Também entrei em contacto com a prática da agricultura, pois de Novembro de 1975 a Setembro de 1976 não me furtei a ajudar na lida do campo, desde a apanha da azeitona, seu retalho para consumo interno e acompanhamento no lagar ao fazer o azeite até à vindima e feitura do primeiro vinho e aguardente com a minha ajuda directa. O corte da lenha para a lareira ficou inteiramente por minha conta. Fiquei exímio no machado, cunha e marreta, pois não dispunha de serras eléctricas ou motorizadas. Era tudo à "unha". Além disso, como o meu sogro era o Presidente da Junta de Freguesia, ajudei-o no expediente. Como tinha máquina de escrever, todos os documentos passaram a ser dactilografados e com um aspecto mais "burocrático" e funcional.

Só ao fim de oito meses, ainda sem terem resolvido a situação dos funcionários assalariados, é que, por intermédio do Sindicato dos Profissionais de Artes Gráficas, onde me inscrevi quando estive em Lisboa, consegui emprego à experiência.

Consegui emprego como Oficial Montador de Offset numa empresa Gráfica de Lisboa, à experiência por uma semana, para exercer as funções do antigo Chefe de Secção que estava agora a trabalhar no Sindicato.

Como era necessário experiência numa profissão qualquer para conseguir emprego, precisava de conseguir, muito rapidamente, a Carteira Profissional de Artes Gráficas, documento necessário para progredir na profissão e conseguir emprego no país. Funcionário público não dava condições para conseguir emprego na actividade particular. Tinha de ter uma profissão concreta. Mediante as provas apresentadas, certificado de habilitações literárias e requisição de uma empresa de Artes Gráficas para exercer funções como Oficial Montador de Offset, foi-me facultada a referida Carteira Profissional.

Ao fim da semana de experiência fiquei com contrato a seis meses. Depois de dois meses ofereceram-me o lugar de Chefe da Secção de Fotolito e Montagem, que eu neguei. O ambiente revolucionário naquele tempo, 1976, não era propício para assumir aquele lugar de grande responsabilidade sem poder nenhum, nem autonomia.

Ao fim de quatro meses fui chamado à administração e informaram-me que ficaria no Quadro definitivo da empresa e ofereceram-me o lugar de Director Técnico, tendo em conta o meu curriculum, que tinha apresentado, as habilitações académicas e a postura que observaram no meu comportamento profissional e social. Naquele tempo, era raro encontrar um profissional de artes gráficas com o antigo 7º ano dos Liceus e um Curso técnico de psicologia. Normalmente eram profissionais que aprenderam observando os operários mais antigos, e só com a antiga quarta classe como habilitações.

O problema, de início, foi encontrar um local para viver. Graças a um familiar da minha mulher, emprestaram-nos uma casa até eu conseguir arranjar habitação. O dono dessa casa, fê-lo por consideração a esse familiar da minha mulher que tinha, e tem, uma alta posição na sociedade portuguesa, mas, talvez por desconfiança e medo que desviássemos alguma coisa, apareciam de improviso e a qualquer hora do dia apenas para dar "uma vista de olhos".

Era difícil conseguir casa (havia casas vagas) e só o consegui porque quem passou a contactar os possíveis senhorios passou a ser a secretária da direcção onde eu prestava serviço e a alugou, em meu nome, com o aval da administração que serviu como fiador.

Mais tarde, o procurador da vivenda (o senhorio é um emigrante), numa conversa connosco, vangloriava-se que tinha feito uma selecção muito rigorosa na escolha dos inquilinos, impedindo, principalmente, o aluguer a "retornados".

Mal sabia ele que eu era um retornado. Mais tarde disse-lho na cara, mas não se desmanchou.

Essa Litografia, onde trabalhei, pertencia a uma holding que, além de uma empresa de material industrial pesado geria mais cinco empresas, todas de Artes gráficas, sendo uma especializada em impressão em chapa e quatro em papel, duas no Porto, uma em Setúbal, uma em Santa Iria de Azóia e uma em Lisboa.

Só esta Litografia tinha cerca de 40 operários distribuídos pelas três Secções principais, Fotolito, Impressão e Acabamentos, mais cerca de 20 empregados distribuídos pela portaria, secretaria, armazéns, cozinha e refeitório, limpeza e vendedores. Ficariam todos sob a minha alçada directa, bem como os orçamentos e estabelecimento dos preços dos trabalhos a executar.

A Administração (a da holding, que tinha a sede precisamente na Litografia onde eu prestava serviço) providenciava apenas os recursos que eu solicitasse para a produção.

Como era um cargo executivo e com autonomia suficiente para desenvolver algum trabalho meu, com ideias minhas e coordenação livre de intromissões, aceitei o lugar.

Para terem uma ideia das dificuldades daquele tempo. Aquela empresa, quando foi o 25 de Abril entrou em grandes convulsões e os operários mais politizados, resolveram "correr" com a administração e ficaram a funcionar em colectivo. Resultado: não conseguiram ganhar para os ordenados e afundavam-se cada vez mais, sem ninguém com capacidade para a gerir. Quando "descobriram" que a política não era uma forma de sustento, pois tinham família para sustentar e contas para pagar, acabaram por "aceitar" o regresso dos patrões, pois é mais cómodo chegar ao fim do mês e receber um ordenado sem terem responsabilidades. O problema, agora, eram as dívidas acumuladas. E como seria de prever, a administração não estava nada interessada em sustentar parasitas que tempos atrás os puseram na rua, havendo sempre aquele clima de desconfiança por um lado e de vingança pelo outro, estando eu no meio do "fogo cruzado".

Portanto, a recomendação que recebi logo no primeiro dia na Direcção foi que teríamos de produzir para pagar as despesas fixas e ordenados, porque senão corríamos o risco de ter que fechar as portas. Quanto às dívidas antigas, era problema deles (dentro da holding até calhava bem ter uma empresa deficitária. Os economistas sabem porquê). E assim foi. Enquanto lá estive ganhamos para esse objectivo.

Mas a Comissão de Trabalhadores foi sempre um espinho que não deixava introduzir algumas melhorias nos métodos de trabalho, pois estavam sempre de pé atrás e não havia aquele à vontade e confiança a que estávamos habituados em Angola.

Nem quero contar aqui os problemas, o stress constante, as dores de cabeça e costas, e tudo o mais porque passei com aquele "peso" encima. Nunca, na minha vida julguei encontrar pessoas daquele calibre e tão pouco amigos de trabalhar. Tinha de me impôr pelo conhecimento técnico e prático das coisas, mostrando, sem sombra de dúvidas, que sabia executar o trabalho que lhes estava a exigir. Se assim não fosse, surgiam toda a espécie de motivos e desculpas para a não execução, em tempo, de qualquer encomenda.

Queriam um "emprego" e não "trabalho". Eu era um "retornado", aquele "intruso" que caiu ali de pára-quedas e para mais a "mandar". Encontrei-me no meio do fogo cruzado entre empregados e administração. Por cada ordem de serviço que emitia, tinha a Comissão de Trabalhadores no meu gabinete a protestar, pois não conseguiam compreender que, para terem o salário ao fim do mês, tínhamos de ter o mínimo de disciplina laboral e trabalharmos. Nunca me esqueci que, apesar de deter um lugar de direcção, era um empregado como eles e procurei sempre defender os nossos direitos. Não podíamos estar constantemente em reuniões políticas que a nada levavam. Mas levei o barco a bom porto.

Depois de me despedir, a Administração ainda me propôs continuar com uma avença, indo lá apenas uma hora ao fim do dia para fazer os orçamentos e dar assistência técnica.

Aceitei por um ano apenas, pois surgiram outras oportunidades mais tentadoras e menos setressantes, apesar de tudo.

Soube, depois, que o Director técnico que me substituíu, mais exigente e mais burocrata e amigo de puxar pelos "galões", acabou por ser agredido na secção de impressão.

Há uma grande diferença entre o Chefe e o líder. O Chefe manda fazer, o Líder mostra como se faz.
Depois de ingressar novamente na Função Pública, por me terem indeferido o pedido de continuar a trabalhar na actividade privada enquanto aguardava colocação, fui chamado apressadamente para vários serviços. Devido ao Curso de Psicologia, e componente de Psicopedagogia, já no meu Curriculum, ainda fui chamado para um reformatório em Caxias em que um técnico de Artes Gráficas com as minhas habilitações e conhecimentos psicopedagógicos seriam o ideal para o ensino profissional naquele reformatório. Só que queriam trabalho especializado a ser remunerado pela categoria de operário que me "impuseram" no QGA, em que me baixaram cinco letras e, como seria lógico, não aceitei, assim como não aceitei outra colocação no Ministério da Educação que, na altura, estavam a formar equipas de psicologia encabeçadas por licenciados, auxiliados por técnicos de psicologia, como era o meu caso, mas a ser remunerado pela categoria que me atribuíram no QGA e não pelo trabalho que iria executar.

Enquanto não fosse reclassificado para uma carreira adequada às minhas habilitações e valia profissional recusei trabalhar naquelas condições.

Se os funcionários oriundos do ultramar tinham uma dada carreira, porque razão não os mantiveram na mesma categoria de origem (ou equiparada, se não houvesse tal categoria nos quadros do continente) mas atribuíam-lhes sim outra normalmente com letra mais baixa?

A confusão era tanta que muitos baixaram de categoria (e de letra consequentemente), mas continuaram a ganhar pela letra de origem, o que os prejudicou mais tarde quando foram feitas subidas de escalão nas categorias. Como ganhavam pela letra de origem, todos os funcionários de categoria inferior, ao serem beneficiados com a subida de letra, ficaram equiparados a eles, o que na prática só os prejudicou porque deveriam também subir o seu escalão remuneratório e isso não aconteceu. Ficaram pura e simplesmente "congelados" naquela posição até que a categoria que lhes foi atribuída chegou a ter a mesma remuneração da sua letra de origem. Uma autêntica vigarice.

Finalmente fui requisitado para a nova Direcção-Geral de Extensão Rural, que não existia em Portugal, sendo a experiência da Missão de Extensão Rural de Angola aproveitada para incrementar em Portugal a mesma filosofia. E os quadros e profissionais de Angola foram captados para aquele projecto, eu incluído para erguer o parque gráfico, ferramenta indispensável da Direcção de Serviços de Informação Agrária. Como era conhecido e antigo colaborador do recém-nomeado Director-Geral e confiando que seria reclassificado, aceitei o lugar.

Como sucedeu com a maioria dos funcionários "retornados", fui altamente prejudicado na minha carreira, em termos monetários e promoções, em que só ao fim de dez anos fui reclassificado para uma carreira técnica em função das habilitações e cargo exercido. A partir daí a progressão até foi rápida, mas com as mudanças recentes que o Estado português introduziu, numa clara má fé e desrespeito pelos contratos que fez com os seus funcionários, tirando-lhes as regalias que tornaram mais atraente o ingresso de profissionais na função pública, vi-me (com 42 anos de serviço, contando o serviço militar a dobrar) na necessidade de pedir a aposentação numa altura que ainda teria muito para dar, só para não ser mais penalizado do que fui.

Quando larguei a actividade particular, onde gozava de uma boa posição de chefia e possibilidades de singrar em qualquer das empresas daquela holding (que ainda laboram hoje), para ingressar novamente na função pública, indo ganhar menos, era porque as condições que o Estado Português, como entidade empregadora, oferecia para o futuro eram melhores, só que nunca pensei que esse mesmo Estado, ao fim de 25 anos, mudasse unilateralmente por completo essas condições contratadas, sem o mínimo de respeito e consideração.

Quer dizer: O Estado ofereceu determinadas condições de carreira para admitir empregados e quando esses empregados estão à beira da reforma, veio dizer-lhes "agora as condições oferecidas foram suprimidas. Vocês vão-se reformar com muito menos do que lhes prometemos, bem como já não terão as outras regalias e incentivos prometidos".

Estes empregados, estando eu incluído, nada puderam fazer a não ser aceitar passivamente esta imposição de força, porque se passou uma vida de trabalho e não há hipóteses de mudar ou iniciar por outro lado.

O Estado governado por estes novos políticos portugueses mostrou não ser uma pessoa de bem.




Ruca

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NOTA – Este fio pretende deixar um documento singelo, agrupando todos os textos de interesse para se ter uma ideia aproximada do que foi o pós 25 de Abril e a verdadeira odisseia dos portugueses em fuga e toda a sua luta para começarem tudo de novo neste país que, no princípio, os recebeu como verdadeiros malfeitores. Todos podem dar a sua comparticipação, sem revelar nomes comprometedores, ou entrar em pormenores demasiadamente íntimos, porque o que interessa é saber o que se passou e não os nomes dos locais exactos, das pessoas ou das entidades envolvidas.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Retorno a Portugal dos restos mortais de militar falecido em Angola



Pobre Portugal de meia dúzia de senhores... que sequer foi capaz de ajudar as familias na transladação dos corpos abandonados dos seus soldados mortos em Angola! E no entanto quando se quer, consegue-se e a prova aí está :dinheiro para salvar Bancos...
Para mais infotmação, clicar AQUI

Retornados numa aldeia do norte de Portugal: 1976

Retornados do Ultramar: trecho de video

Retornados do Ultramar: entrevista com Maria Elisa

Integração não apaga memória dos retornados de África



Com a descolonização, meio milhão de portugueses retornaram de África. Passadas mais de três décadas, a ligação ao continente africano, a sua " terra", continua forte como veremos...

Espoliados do Ultramar


Portugal está em dívida para com os espoliados do Ultramar


Portugal está em dívida para com os espoliados do Ultramar. Portugal tem o dever moral de pagar essa dívida, indemnizando as familias a quem, através de intensa propaganda na Metrópole, fez deslocar para as «colónias ou «províncias ultramarinas» como lhe queiram chamar, no primeiro caso, paulatinamente, e mais propriamente a partir da Conferência de Berlim (1885/1885) , depois, e com maior intensidade a partir de 1950 e sobretudo a partir de 1961.

Portugal está em dívida para com os espoliados do Ultramar. Portugal tem o dever moral de pagar essa dívida, indemnizando as familias , na sua maioria gente trabalhadora e despolitizada, que trabalhou duro e investiu na terra quanto ganhou, transformados que foram nos «bodes expiatórios» das experiências da colonização.

«Todos os países que tiveram colónias, indemnizaram os seus cidadãos, os portugueses investiram em Angola, venderam o que tinha no seu País para rumar para Africa e continuam a pedir que se faça justiça», destaca ao acrescentar: «O governo português, infelizmente, o que faz ainda é anti-pressão e elogio, procura por todos os meios passar para a opinião pública que não temos quaisquer direitos, ou que tudo tinha sido roubado e adquirido ilicitamente.... é precisamente porque estão vivas as figuras gradas que fizeram a descolonização que se pensa assim», lamenta Lucas Martins.

«Por que motivo os alemães vêem as suas fazendas devolvidas por Angola e nós portugueses continuamos a aguardar justiça há mais de 33 anos, senhor Primeiro-Ministro ?» É esta a pergunta que as duas associações de espoliados do Ultramar deixam ao Governo de Sócrates
Isabel Guerreiro

NOTÍCIAS vindas de Luanda dão conta de que o Governo angolano está a devolver dezenas de fazendas a cidadãos alemães que abandonaram o território africano por altura da independência, em 1975.
Segundo o jornal «Africa Monitor» «o incremento por que estão a passar as relações angolano-alemães é devido a uma política condescendente de Angola face a exigências da Alemanha, tendo em vista a devolução de fazendas de que cidadãos alemães foram desapropriados a seguir à independência do território»
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A notícia acrescenta ainda: «os processos de reclamação das fazendas, movidos pelos antigos proprietários alemães (ou herdeiros), vinham deparando com a dificuldade acrescida de algumas delas, em especial as situadas na província Cuanza-Sul, estarem ocupadas ou serem usufruto de personalidades da elite. A Alemanha alegou que os seus nacionais residentes no território à época de independência abandonaram Angola por razões de força maior desordem violenta, que inclusive provocou mortes».
«Por que motivo os alemães vêem as suas fazendas devolvidas e nós portugueses não, senhor Pri-meiro-Ministro ?»

É esta a pergunta que as duas associações de espoliados gostavam de ver respondida pelo Governo de Sócrates.
Ou será que Portugal está interdito de alegar motivos identicos aos que a Alemanhã alegou? Má consciência perante os que deixou abandonados a uma guerra fraticida? Má consciência perante os que tiveram que partir e abandonar tudo?

Só sente e continua a sentir o problema quem o realmente viveu, porque os que vieram a seguir ao 25 de Abril, os instalados no poder, estão todos bem, estão todos ricos e perderam a sensibilidade.

Conclusão pura e simples: o tempo vai passando, muitos dos espoliados já faleceram, outros vão falecendo... Já faltou mais do que falta para que os «donos» de Portugal possam definitivamente lavar as mãos, não a consciência, sobre este assunto!

Leia em:
Download angola_devolve_propriedades_aos_alemes.doc
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- http://www.aemo.org/index.html
- http://www.aeang.com/
-http://macua.blogs.com/25_de_abril_o_antes_e_o_a/2008/09/conhecido-o-pre.html

AS OPORTUNIDADES DOS "COLONOS"


Tenho lido com alguma frequencia que Angola era uma terra cheia de oportunidades, o que realmente é verdade, não deixa contudo de ser puro engano dizer-se que bastava alguém ser bom trabalhador para enriquecer.

Li recentemente um livro cujo autor diz ter vivido alguns anos em Angola e espanta-me que também ele ajude a passar esta idéia enganadora. Embora seja um romance e por isso à partida classificado de pura ficção, não deixa contudo de cair neste erro. Lê-se ali que um casal chegado a Luanda, em pouco tempo já tinha negócios espalhados por toda a cidade e logo a seguir pelas principais cidades de Angola, isto sem falar da compra de uma "casa" na Vila Alice.
Não espantava se esse casal fosse endinheirado e procurasse Angola para investir, o que não é o caso. Por vezes parece que existem duas Angolas diferentes, aquela que eu e a maioria conhecemos e uma outra, onde se chegava e se encontrava prontamente uma "àrvore das patacas" e se enriquecia duma hora para a outra. Eu nasci em Angola e embora houvesse diferenças de classes como na maioria dos países, a verdade é que era necessário muito trabalho para se viver com algum desafogo e a maioria pode atestar que também não dava para se fazerem muitas "avarias".
Assim, das duas uma, ou eu e muitos outros fomos pouco inteligentes e nunca soubemos ver os "grandes negócios", ou simplesmente nunca encontramos a tal " árvore das paracas".
É bom que se diga a verdade, era uma linda terra, um povo hospitaleiro e humilde, mas quem começasse do nada como o meu pai e muitos outros que ali chegaram na década de 50, mesmo com muito trabalho, nunca chegaram a ter essa tal vida faustosa que se encontram ilustradas nalguns romances.
Lá como cá, se houvesse respeito pelo "próximo", creio que as oportunidades eram iguais!

Fracra Rone in Cubatangola