domingo, 1 de abril de 2012

Espoliados de Angola exigem justiça. Portugal abandonou espoliados de Angola


Êxodo dos portugueses abandonando tudo o que tinham devido
à falta de segurança que lhes tornou a vida em Angola impossível.



Portugal abandonou espoliados de Angola
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Presidente da Associação, Manuel Valente, diz que Acordo não foi cumprido O Estado deve milhões de euros aos portugueses que foram obrigados a regressar à Metrópole, fugindo da ex-Província Portuguesa de Angola. Para trás ficaram casas, edifícios e todas as poupanças de uma vida. Mário Soares, Cavaco Silva, José Sócrates, Passos Coelho e Paulo Portas não escapam às críticas. A política portuguesa enrolou, escondeu e ainda tenta silenciar uma das maiores injustiças da História do País.

São quase mil os espoliados portugueses que têm processos em tribunal contra o Estado para tentar reaver parte do que é seu por direito. Estes portugueses, no momento da descolonização, residiam e tinham os seus haveres na antiga Província Portuguesa de Angola. Garantem que,
em 1975, foram "coagidos" a abandonar Angola e a refugiar-se na então Metrópole "por força da situação de guerra civil, de perseguição étnica e de ódio racial existente no território".

Com hora e data marcada, o drama começou em Julho de 1975 e acabou quatro meses depois. Tempo suficiente para evacuar meio milhão de pessoas e dizer o último adeus a Angola: centenas de aviões e milhares de voos. Aos números imprecisos soma-se a história daqueles que nunca
mais regressaram. O Estado já lhes deu razão por diversas vezes. Seguiram-se, ao longo de mais de 30 anos, despachos, promessas e grupos de trabalho. Até hoje, estes homens e mulheres vivem com a angústia de quem deu tudo por um País que, há três décadas, tenta esquecer que um dia deixou que lhes roubassem tudo o que tinham.

A O DIABO Manuel Valente, presidente da Associação dos Espoliados de Angola, explica que Portugal até já fez o levantamento dos bens deixados para trás, mas nem um centavo chegou às mãos daqueles que ajudaram a construir um Império Ultramarino. "Fomos obrigados a deixar tudo para trás. Os nossos bens, os imóveis e móveis, a nossa situação familiar e o estabelecimento das nossas vidas. Os documentos com a relação dos bens deixados em Angola estão nas mãos do Estado português -que ainda não fez nada. Somos o único país colonizador que não ressarciu os seus cidadãos espoliados. Bélgica, Alemanha, Holanda, Grécia, França... todos estes países já resolveram o assunto com os seus nacionais", indigna-se. As culpas, dizem, recaem nas "opções políticas" da época. Às quais Mário Soares não é imune. São "recados" vindos de quem se lembra
desses dias como se tivesse sido ontem. "A ausência de consulta foi, em si mesma, um facto ilícito face às disposições da lei constitucional vigente no momento da prática dos factos", acusam.


O Acordo de Alvor O presidente da Associação de Espoliados de Angola afirma-se estupefacto
com o facto de os acordos de Alvor nunca terem sido cumpridos. "O Acordo não foi cumprido e Portugal não fez nada para que ele fosse cumprido. Por muito menos as Nações Unidas já intervieram em outros países. Foi tudo uma questão política, somente isso. Em Agosto de 1975,
Portugal suspendeu a vigência dos Acordos, deixando cair a já pouca protecção jurídica de que beneficiavam os portugueses residentes em Angola".

"Eu vi elementos do MPLA com armas e veículos portugueses. Eu vi...", sublinha Manuel Valente, batendo com o dedo indicador na mesa para reforçar a sua ideia. De facto, no processo avançado contra o Estado pode ler-se: "O MPLA, com a cooperação de tropas portuguesas (...) praticou
actos de genocídio, (...) assaltou, incendiou e pilhou propriedades de residentes de todas as raças e credos religiosos. O MPLA (...) torturou, manteve em cativeiro, molestou sexualmente e assassinou um número indeterminado de pessoas no território de Angola".


"Ficou lá tudo. Até os nossos depósitos bancários. Na época era proibido e punido com pena de prisão a transferência de valores monetários e de mercadorias valiosas de Angola para a Metrópole. A política, até então,defendia que nós construíssemos lá a nossa vida. O Estado fomentava, antes do 25 de Abril, a deslocação de portugueses para o Ultramar dizendo
que Portugal seria um Estado pluricontinental e multirracial. Angola era o país africano mais desenvolvido, juntamente com a África do Sul. Os portugueses deixaram lá obra feita: pontes, edifícios, os caminhos de ferro... Eles é que depois destruíram tudo", relata Manuel Valente.

Este processo de fuga foi tudo menos pacífico. As pontes aéreas e marítimas para retirar os portugueses de Angola decorreram a grande velocidade, mas sobre enormes críticas. A 11 de Novembro de 1975 Portugal procedeu à transferência de poderes para o MPLA e à declaração
de independência de Angola. Contudo, o Estado português não reconheceu diplomaticamente o Estado de Angola. O problema: "os cidadãos portugueses deixaram de gozar de protecção diplomática ou consular dos seus interesses no território de Angola, país com o qual Portugal não mantinha relações diplomáticas". Portas esteve perto Há muito que os espoliados de Angola lutam junto do poder político. E há muito que se fazem promessas. Em 2002, Paulo Portas, em plena
campanha eleitoral, garantiu à Associação de Espoliados de Angola que iria criar um grupo de trabalho para estudar a solução do problema. Viria a cumprir a promessa em Fevereiro de 2005 - já com a liderança de Pedro Santana Lopes - a poucas semanas da queda do Governo e das eleições
que dariam a vitória a José Sócrates." "O Portas teve milhares de votos à nossa custa. Mas sabíamos que estávamos a ser usados. Ainda lançou o grupo de trabalho, mas foi quando viu que ia sair. Depois veio o Sócrates e nunca mais se avançou", lamenta Manuel Valente.


Em "Diário da República", de 3 de Fevereiro de 2005, o Governo de Santana Lopes emite um despacho em que assume a responsabilidade e a injustiça desta maldita história: "Não obstante terem decorrido cerca de 30 anos sobre a independência dos ex-territórios ultramarinos, os sucessivos governos não conseguiram ainda dar uma resposta suficiente aos problemas e injustiças que afectam um significativo número de portugueses que se viram forçados a regressar a Portugal durante e por causa do processo de descolonização". A assinar este despacho: Bagão Félix, ministro das Finanças; Martins Monteiro, ministro dos Negócios Estrangeiros; e Fernando Negrão, ministro da Segurança Social.

O grupo de trabalho nunca foi constituído e Sócrates, que sucedeu no  cargo de primeiro-ministro, nunca pegou no caso. Apesar de em Janeiro de 2006, o Governo ter respondido à Associação garantindo que o grupo de trabalho continuava a ser uma realidade, sendo o seu objectivo propor
soluções aos portugueses "que se viram afectados nos seus direitos". Hoje, na cadeira do poder está Pedro Passos Coelho - num governo de coligação com Paulo Portas. O mesmo que prometeu um grupo de trabalho para resolver o problema criado pelo País a muitos dos seus cidadãos. No banco dos réus continua o Estado, aproveitando-se da Justiça demorada e onerosa construída ao longo dos últimos anos. ■

Em 1992, o Estado até reconheceu sua responsabilidade pelos danos emergentes do processo de descolonização. Em resolução do Conselho de Ministros, a 16 de Abril daquele ano, o Governo de Cavaco Silva assumiu a sua culpa. Era, pensou-se, o primeiro passo para o fim de um problema
que "se tem arrastado e envolvem a necessidade de maior e melhor atenção por parte do Estado". Designadamente no que respeita aos "interesses dos portugueses cujos bens e direitos foram confiscados, nacionalizados, ocupados ou intervencionados no decurso dos processos
de descolonização", a par da necessária "resolução dos problemas cuja responsabilidade envolvem mais directamente o Estado Português". Dois anos volvidos, criou-se - com uma duração de cinco anos - o Gabinete de Apoio aos Espoliados. O trabalho inicial foi feito: o levantamento e análise das questões basilares conexas com um eventual processo de
indemnização. Mais uma vez, findo esse período de duração, nada havia sido feito e o Gabinete extinguiu-se sem que nenhuma outra estrutura surgir-se para o substituir. Nesse mesmo ano de 1997, já no Governo de António Guterres, aprovou-se um Orçamento de Estado onde se encontrava inscrita a "Regularização de Responsabilidades" que serviria para "regularizar responsabilidades decorrentes de situações do passado, designadamente (...) [a] satisfação de responsabilidades decorrentes do processo de descolonização em 1975 e anos subsequentes". Porém, tal não passou de mais uma manobra governamental e, verdade é, os espoliados nunca viram tal dinheiro.


O DIABO – 07.02.2012
 
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10 comentários:

Antº Rosinha disse...

Ainda há muito retornado que tem vergonha que os vizinhos saibam que é retornado.

Ser retornado é uma experiência que uma minoria sofreu.

Deve ser valorizada ao máximo essa experiência, que foi difícil, mas troxe sabedoria a quem passou por isso.

José Sousa disse...

Amiga Maria Jardim!

Adorei este tema, pois eu encontro-me no meio desses espoliados! É uma injustiça o que os governos portuguses fizeram e continuam a fazer desde o 25 de Abril de 1974. São uns ladrões e criminosos, ao entregarem de mão beijada Angola a um partido assacino MPLA.

Um abraço e lhe espero láo no meu: http://www.congulolundo.blogspot.com

Anónimo disse...

Todo o retornado deve ser indemnizado, chega de tanta falta de sensibilidade para com todos aqueles que deixaram tudo e foram abandonados pelo Estado Portugués e que ainda hoje vivem traumatizados . La deixaram os seus bens, pagaram la os seus impostos e aquí esse tempo nao conta. Os Alemaes receberam as suas indemnizacoes, e os portugueses(nada)

Anónimo disse...

Tenho muita honrra em ser retornado, fizemos um grande pais que nao teve continuacao tudo desfeito, sinto tristeza pelo abandono de todos que tudo la deixaram e nada receberam so o nome RETORNADO, a historia ainda nos vai dar razao

Anónimo disse...

É bom que as pessoas desabafem, todos temos o direito à palavra e à indignação. Mas também seria bom que todos estivessemos dotados de uma qualidade que se chama "empatia" que é a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro. Sem dúvida que todos os retornados deveriam ser indemnizados, sem dúvida que os retornados foram os bodes expiatórios da colonização. Mas que força moral e material tinha Portugal após séculos de uma pseudo-colonização que envolveu tráfico de escravos e humilhação, que gerou antagonismos raciais, um país pequeno e pobre que nos últimos 40 anos se havia isolado do mundo e que pouco fez em termos governamentais no sentido de ultrapassar os efeitos recalcados de séculos de humilhação? Não estou a referir-me aos portugueses que alí viveram, também eles vítimas da situação, mas a todos queles que na Metrópole detinham o leme do poder e que após a Confª de Berlim (1885-6), foram empurrando para África colonos que deram o litro, a coberto dos quais uma minoria bem instalada na Metrópole ia colhendo os melhores frutos, impedindo, incluso Angola, os portugueses que alí viviam e os angolanos, até bastante tarde, de progredir. Só quem conhece esta situação é quem viveu em Angola antes de 1950. Depois veio o progresso pós 1961, mas já tardiamente por força de uma sublevação que já tinha por detrás interesses estrangeiros neocolonias, e à custa de uma guerra sem fim à vista, e que não poderia augurar nada de bom. Quem era Portugal para se impôr a uma corrente que hoje já se vislumbra com nitidez e que embora não nos dessemos conta foi a mola de tudo: o neoliberalismo e a globalização? Quem nos mandou para fora de Angola não foram os capitães de Abril embora nos custe a assimilar, foram as grandes potências que já nessa altura tinham seus objectivos para Africa que passavam pela saida dos portugueses...

Anónimo disse...

Pois e agora so falta saber se quando eu occupar a casa de um Angolano em que eu ja tenho o olho em cima em Portugal se o meu estado tambem me vai proteger.Tambem estava a pensar em ficar com algumas coisas da Isabel dos Santos......lol

Anónimo disse...

Excelente artigo. Vim de lá com um ano e os meus pais, numa mala que ainda hoje existe, e que me motiva para a vida, trouxeram "todos" os nossos haveres. Contudo, Sr, Otelo e Sr. Rosa Coutinho, onde fazem os Srs. negócios? E porque razão Agostinho Neto terá afirmado "...agora que Angola estava perdida, ... os portugueses deram-na de bandeja..."!

Anónimo disse...

nos os portugueses., vindos das colonias ,perdemos tempo e o tempo e ouro a discutirmos dos bens deixados, pois eu entendo tb eu e minha familia dichamos, mas o que esta em i:foi de portuagal nos ter abandunado , eu sou testemunha disso porque meu pai 3 geracao nascida em angola e nunca fiserao mal a um preto, nos davamos sacos e sacos de sal , e muitas outra coisas aos chefes das tribos, mas ele falceu em 1972 e minha mae ficou viuva c 4 filhos ,ate 1975 ficavamos dentro da nossa casa e com medo nem ouviamos radio pois se um dos partidos ouvissem ,matavam nos e assim nao soubemos da ponta aerea ,era outubro de 1975, quando um chefe de uma tribo foi bater a nossa porta e disse nos para fugirmos p o aeroporto ,pois nova lisboa nao tinha mais brancos na cidade, minha mae nao acreditou e andamos por umas ruas para sertificaramos , e nao morremos , ate a presente data nao encontro explicacao , nao havia carros ,nao havia gasolina e como e que iriamos para o aeroporto, isto e mais uma mulher e viuva com 4 hilhos menores , e eu digo ate eu morrer quero ver o mario soares na prisao e muitos mais e o governo tera que nos dar dinheiro porque somos seres humanos e deviamos levar o governo a tribunal europeu como os judeus fiserao , vamos portugueses corridos das nossas terras ,vamos a guerra ,vamos nao com cravos nas espingardas ,mas agora com tiros ,isto so vai a tiro porque o governo e corrupto

Anónimo disse...

Caríssimos
Angola deram-na de bandeja, como assim? Os portugueses ocuparam ilegalmente. Angola é dos Angolanos, os portugueses é que geriram mal a situação e ate hoje acontece o mesmo erro.
Angola é estado democrático de direito, tem um partido que venceu as eleições.
Meus amigos temos olhar para frente, como é possível um estado como Portugal apoiar a UNITA
O estado português deve trabalhar, colaborar, com o estado angolano no sentido de ver uma solução dos problemas do passado se não nada feito. As coisas mudaram.

Anónimo disse...

"Em terra de cego, quem tem olho é Rei !" A partir de Julho de 1975, com o eclodir da guerra civil em Angola e a saída forçada de centenas de milhares de portugueses, deu-se início à ocupação desenfreada, por parte dos angolanos afectos aos movimentos de libertação, de dezenas de milhares de imóveis pertencentes aos ex-residentes euro-africanos ... Todos sabemos que foi assim que as coisas aconteceram, mas nem todos sabemos o que aconteceu depois às nossas casas, aos nossos apartamentos, às nossas lojas, às nossas fábricas, às nossas empresas ... Pois bem, passadas que estão 4 décadas desde a nossa expulsão do território de Angola, este tema ainda é encarado, pelas "elites" angolanas, como um assunto tabú, principalmente porque a "distribuição da herança" obedeceu a regras estritas de hierarquia, no seio do partido dominante (MPLA), tendo a "crème de la crème" do património construído pelos portugueses sido "reservada" (à falta de melhor termo!) para usufruto da "elite dirigente", quer se tratasse de palacetes na restinga do Lobito, quer ainda de casas de praia no Mussulo ou mansões em Alvalade ou Miramar (Luanda) ... ou em qualquer outro lugar ! É claro que a Lei do Uso Capião da Terra e do Património Construído, oportunamente aprovada pela República Popular, veio dar uma "pincelada de legalidade" ao sequestro dos nossos bens imóveis, desencorajando definitivamente qualquer pretensão posterior pela reintegração de património, reivindicada por cidadãos portugueses ex-residentes no território de Angola, devidamente documentados para tal ... É verdade que os sucessivos governos de Portugal nunca patrocinaram, como deviam e inequivocamente, uma solução que pudesse minimizar os enormes prejuízos patrimoniais causados aos seus "ex-agentes coloniais" (como também, e muito injustamente para a maioria, já nos chamaram), mas também é verdade que, na vertigem história do 25 de Abril de 1974, a deriva política então prevalecente "matou" logo, e à partida, muitas das hipóteses de se vir a atingir, posteriormente, uma solução que trouxesse alguma justiça ao drama involuntário vivido pelos "Retornados" ... Espero que, pelo menos a História de Portugal, venha a reconhecer a enorme injustiça cometida sobre meio milhão de portugueses, em nome dos inegáveis Valores de Abril.