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Era uma vez uma menina
…Que Partiu Para Angola..
Algures neste País encantado mas cheio de desencanto para muitos, nascia uma menina à 10.05h da manhã, que era a ternura dos seus pais e do seu irmão, a quem lhe chamavam com imensa ternura, de bonequinha ou o o seu pai babado a minha princesa.
Nos 5 anos que se passaram, após esse dia, pouco ou quase nada se lembra, a não ser de uma certas diabruras, próprias para a sua idade, mas logo eram esquecidas, com os mimos de sua mãe a esquecerem alguma palmada, dada no tempo e na hora certa.
Um dia, essa pequenina, começa a ver que algo estranho estava-se a passar em sua casa, as suas mobílias desapareciam, havia uma azáfama total, na sua família, que nem atenção nenhuma lhe davam ,ela ouvia, ouvia, mas.......nada percebia, a tal pequenina, quando.....
Se viu dentro de uma navio enorme chamado Império que, a levaria para terras distantes, rumo Angola, palavra que ela conhecia muito bem, da história que sua mãe lhe contava, a história do Macaco do Rabo Cortado,.purumpumpum...vou-me embora para Angola.....
Lá fui eu para a Terra do Macaco...
Ouve-se o apito do barco.....um som agudo que estremece qualquer alma...até a de, uma menina de 5 anos..., não será esse o nome, pois para ela é um som que ainda lhe trás recordações que a faz chorar, mas o barco a apitar, os lenços brancos a acenar, as pessoas a chorar, que grande confusão, para uma cabecinha, tão pequenina, que estaria a acontecer e que mais lhe iria acontecer?
Agora morava numa casa que ficava no mar? HIIIII! E que tanto lhe fazia enjoar, mas porquê? Perguntava ela, mas passaram 11 dias....e,.
Chegou o dia, em que lhe mostraram a sua nova casa., esta em terra firme, e, que terra, vermelha, escaldante......começa aí....à menina de 5 anos...as diferenças....
As serras, chamavam-se barrocas, muitas das casas era de capim e barro e, chamavam-lhe cubatas, Ah! Os autocarros, chamavam-lhe maximbombos e, tinham que dormir, com mosquiteiros, mesmo assim, os malvados bichinhos, cantavam a noite toda, para não se fazerem esquecer e, claro, apareceu carne jovem por aquela terra, foi uma farra de arromba para eles e seus amigos bicharocos, coisa que abundava, por aquela terra e, vejam só,.... como as comidas também eram diferentes, logo nesse dia ao almoço,deram-nos a comer, uma comida esquisita acompanhada por algo ainda mais esquisito, para uma cabecinha de 5 anos,..... chama-se a tal comida, Moamba, e o tal acompanhamento Fungi, pode lá ser? Isso era comida?
E os pregões? Eram assim, mais ou menos "É LARANGÉ, LARANGÉ, MIA SIÔ...", O quê? Disseram-me... são laranjas minha minina
Como tudo era diferente....até as cores dessa menina...muito vermelhinha.(chamavam-lhe um tomate saloio)..passado algum tempo...passou a amarelinha.....que mudanças...para uma cabecinha de 5 anos...
Passaram-se os anos, a menina deu lugar a mulherzinha e, aos 14 anos, rebenta a revolução, eram mortos, eram feridos, era terrorismo, da cidade, sobraram poucos, os outros fugiram para o Puto, entre os que ficaram, foi a tal outrora a princesa de seu pai, figura impar naquela terra....o meu barriga de ginguba, ela mais uns tanto, até milicia fez, durante noite e noites, até dormiu vestida, durante noites e noites, e, assim se passaram os anos, quando em 1975, então a boneca-princesa, feita mulher, assistiu aquilo, que jamais esteve nos seus sonhos de menina, ter que abandonar a terra, que outrora, para lá a levaram, onde tanto por lá passou, mas que se habituou a amar, a tal Moamba, seu prato favorito, as suas músicas, os seus batuques, os seus panos coloridos, as suas terras vermelhas, as suas barrocas e o seu perfume preferido, aquele, que só quem andou por essas terras, conhece tão bem, o cheiro a terra molhada,as suas gentes alegres e sempre prontas para uma boa farra, ao fim de semana, as mentes abertas à dimensão do País, a liberdade de andar descalça, mesmo com o risco, de chegar a casa, com os pés cheios de matacanhas, as suas praias de água temperada e as suas ondas, não nos engoliam, mas embalavam-nos, enfim......com uma lágrima, rolando teimosamente digo vezes sem conta........
Angola ....JÀ NÃO É MINHA!!!!!!!
Conto a história de era uma vez...... que eu fui menina e voltei mulher sofrida a Portugal.O resto é vulgaríssimo, igual a todos que regressaram, não com os sonhos, que para lá partiram, mas sim, com um enorme pesadelo.
Ondina 2006
E………..,(continuação de Era uma vez uma menina que partiu para Angola)
Da mulher sofrida, triste, amargurada, revoltada, por ter deixado para trás 25 anos da sua vida, pior do que isso, 25 anos da vida de seus familiares, jamais recuperados, porque a idade não perdoa e o tempo não volta para trás, mas convicta que iria vencer, no País que a vira nascer e a vira partir com 5 anos de idade…..para terras distantes.
E, sempre sob a Bandeira de Portugal e a continuar a ouvir comovida a Portuguesa, mais conhecida pelo Hino Nacional, duas coisas, que eu jamais renunciarei e, esteja aonde eu estiver eu, sempre respeitarei e me emocionarei, pois foram estes dois símbolos que, ensinaram-me a respeitar, porque, disseram-me sempre que, eu estava em terras Portuguesas…e eu acreditei, embora achasse, para aquela cabecinha de menina e, perguntava-me, aonde era Portugal….o dono de Angola..mas…deixava-me levar, como todos os outros…..era assim….e assim era.
Começou a saga, do regresso , mas sempre com o coração, no seu outro País, que outrora, vivia sob a Bandeira que eu tanto amo….mas que , tivera que deixar.
A divisão era grande, dentro de uma cabeça, já com 29 anos, mas, recordando a cabecinha dos seus 5 anos, era a mesma coisa. Como os costumes eram diferentes, como as pessoas eram tão brancas, como o ar tinha outro cheiro, também tão agradável,um perfume que eu adoro… o cheiro da castanha assada, como Lisboa era tão linda, como o Castelo de S.Jorge, tão imponente como tudo era tão diferente……
As mentes, essas tão baralhadas pior do que a minha…. com tudo o que lhes estava a acontecer, depois da revolução dos cravos……..por tudo e por nada, havia uma discussão, e insultavam com nomes, que nem conheciam o significado…o que interessava era ofender…quem e porquê..não interessa..eles eram livres para isso mesmo….para falarem falarem……e daí… com nomes desprositados e fora do contexto de qualquer discussão, como por exemplo:
“Fascistas!!!! O outro, Cala boca Comunista!!!!! o outro Imperialista!!!! O outro, Vigarista!!!!!! Seu Latifundiário!!!!!! Seu Traidor!!!!
As manifestações nas ruas…..eram um espectáculo…pois elas cruzavam-se..e claro…logo se insultavam….eram livres, podiam insultar pensavam eles que a Liberdade lhes dá esse direito ,os nomes dos Jornais….uma graça OLha a Merda!….que coisa estranha…tanta liberdade..eu não estava habituada, porque os palavrões para mim não significavam sermos livres, porque não podia responder da mesma maneira..mas ria..ria muito.
As paredes pintadas pelos anarcas…coisas mais giras….como tudo era diferente….e…não havia guerra…de armas, mas os nomes continuavam…
E, por fim, aos regressados das colónias, o nome pomposo, que nos puseram, até parecia que tinha surgido uma nova raça em Portugal, sim, que naquela altura, nós não eramos Portugueses, porque, não tinhamos dinheiro nenhum,não vinhamos com as carteiras cheias e malas cheias de prendas….não interessavam nada…. vinhamos espoliados de tudo e, principalmente da sua dignidade.
Sempre que viam um caixote, ou estavamos na fila a pedir que nos dessem a esmolinha, no IARN, lá passavam e gritavam RETORNADOS, VIERAM PARA CÁ AGORA ROUBAREM-NOS, NÃO CHEGOU O QUE ROUBARAM LÁ FORA!!!!!!! COLONIALISTAS!!!!!!! Enfim..coisas linda de se ouvirem…para quem tem a alma a sangrar….por tanta revolta..de ver tanta alma negra das pessoas, aqueles que nós pensavamos que eram Portugueses, por isso nos acolheriam…mas não!!!..eles eram tudo menos ser alguma coisa definida….eles tinham medo…que também lhes tirassem os empregos, mesmo que fossem os seus irmãos…eles tinham sido injectados, eles pensavam que eram livres e democratas, nas que sabiam eles o que er democracia e naquel momento serem simplesmente HUMANOS, para com os seus compatriotas e família.
Sim a nova raça, que tinha surgido, era a dos RETORNADOS” .(ainda hoje) mas…..
Como acabava por ser engraçado, sim porque era jovem, e, sempre gostei de trocar a desgraça por uma bela gargalhada, e, como não podia mudar o rumo da história, ia , uma vezes chorando de raiva, outras rindo da nova condição de cidadã Portuguesa, e habituara-me a viver como tal……mas com uma certeza, de braços cruzados, não ficaria, emigrar, não!!!!!!!! Nunca mais me iriam dizer,–” vai-te embora para a tua terra” , inclusivê a todos os meus familiares, lá nascidos,em Angola…. aquilo era só para uns, os outros não eram Angolanos, eram qualquer coisa……que lá tinha nascido….pois!
……. por isso toca a procurar emprego e, encontrei,porque eu queria era trabalhar porque, foi a única coisa que eu sabia fazer, eu e os meus, …trabalhar…..trabalhar.
Tenho a dizer, que encontrei e, também encontrei uma nova realidade, umas novas amizades, uma nova maneira de ver a vida, vidas diferentes, vidas também muito difíceis, vidas de pessoas que nunca daqui tinham saído, mas que de uma maneira ou de outra, não se encontravam diferentes de mim…..vidas….muitas vidas….por viver, por esclarecer….mas, muitos com boa vontade ,para alterar o rumos das nossas vidas, e eu…tive essa boa vontade das pessoas que me rodeavam..e que eu fiz tanta amizade…e que tanto me ajudaram nas minhas horas dificeis em Portugal, já quando me encontrava a trabalhar…..e, como eles foram entendendo com o tempo a verdade das nossas vidas desavindas….
quando as cassetes nas sua cabecinhas começaram a dicaram gastas…
……amigos, podemos tê-los em qualquer parte do Mundo…é preciso é, respeitar o espaço e a mente dos outros….são vidas, cada qual com a mentalidade que lhes deram ou nessa altura, a limpeza do cérebro que lhes fizeram….,mas eles recuperaram e bem. E, eu..segui a minha vida….
Uma vida que dei ao Mundo,outra princesa de seus pais… hoje já tendo dado príncipes que são a minha vida, um Mundo que, mesmo contra todo as as marés e correntes, esse Mundo Português, de que eu tanto me orgulho (não de todos os Portugueses, desses tenho raiva e desprezo e, desgosto de viverem ainda sob a minha Bandeira), tenho a dizer, que amo Angola e todos os seus costumes, aromas, e AI QUI SAUDADES!!!! E, todos os Angolanos que foram e são meus amigos..cá e lá…porque felizmente sempre os tive, e, não seria uma revolução, que cortaria o elo de ligação aos amigos de verdade, pessoas de verdade e eu, tenho dois amores, eu amo Portugal, e nele tornei-me mais mulher, madura, avó, mas pensando muitas vezes na menina-princesa de seus pais, que um dia partira para terras distantes,que eu continuo a AMAR…. essa terra chama-se ANGOLA.
Essa menina-mulher-meia idade e que, espera sem receios a velhice, reconquistou a sua vida e a dos seus familiares e ………ERA UMA VEZ…….
Ver mais:
http://florcampo.multiply.com/
http://horta.0catch.com/lsc/juventudelobitanga.html
http://florcampo.multiply.com/music
CUMPRIU-SE O MAR E O IMPÉRIO SE DESFEZ... A História magoa. A independência das colónias forçou meio milhão de portugueses a tomarem parte numa ponte aérea que os desembarcou em Lisboa trazendo a amargura na bagagem e tendo de se adaptar a uma terra que, em muitos casos, não conheciam. Este blog fala de retornados, espoliados, de gente que perdeu as suas casas e os seus bens, e que, sem receber quaisquer indemnizações do Estado português, continuam nos seus sonhos a revisitar África.
domingo, 17 de julho de 2011
Era uma vez uma menina …Que Partiu Para Angola.. (Ondina Teixeira)
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